Irmãos batizados apenas com sobrenome do pai conseguem retificação de registro civil para incluir patronímico materno

Membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, a advogada Laís Mello Haffers ajuizou ação com o irmão para retificar o registro civil de ambos. A decisão da 4ª Vara Cível de Araraquara, em São Paulo, permitiu a inclusão do sobrenome da mãe dos requerentes no registro civil, que foram batizados apenas com o patronímico paterno.

Segundo o juiz Humberto Isaias Gonçalves Rios, responsável pela análise do caso, o pedido para a inclusão do nome de família materno encontra respaldo no artigo 16 do Código Civil de 2002 e permite melhor identificação do ramo familiar ao qual pertence a parte. “Ressalta-se que a retificação não trará prejuízos a terceiros, à ordem pública e à segurança jurídica”, pontuou.

O representante do Ministério Público apresentou parecer favorável. “O direito ao nome que retrate a correta identificação familiar é direito da personalidade, que deve ser sobreposto à regra da imutabilidade do nome. Com isso, a genealogia materna será preservada”, enfatizou o texto assinado pelo promotor de Justiça José Carlos Monteiro e pelo analista jurídico André Luiz Martins Modé.

O parecer também resgata decisão da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ, no Recurso Especial – REsp 1.873.918/SP, em que a relatora, ministra Nancy Andrighi, entendeu que tais pretensões têm por objetivo “preservar a intimidade, a autonomia da vontade, a vida privada, os valores e as crenças das pessoas, bem como a manutenção e perpetuação da herança familiar”.

Leia a íntegra da decisão da 4ª Vara Cível de Araraquara e o parecer do Ministério Público de São Paulo no Banco de Jurisprudência do IBDFAM (acesso exclusivo para associados).

Peculiaridades do caso

“Ao sermos registrados, os nossos pais optaram por transmitir dois sobrenomes paternos, de forma a excluir a participação do patronímico materno. Bem por isso, eu e o meu irmão sempre tivemos a intenção de homenagear a nossa mãe e possibilitar a continuidade do nome alemão, que vem-se perdendo nas gerações justamente pela preponderância do nome masculino. O caso em questão ainda guarda algumas peculiaridades”, comenta Laís.

Enquanto o irmão apenas introduziu o sobrenome da mãe em seu registro, ela optou também por suprimir um dos patronímicos paternos. “O meu irmão desejava apenas o acréscimo do nome materno, logo após o seu prenome. Enquanto, por questões pessoais, eu desejava a supressão de um sobrenome paterno e a colocação do nome materno por último, tendo em vista que no Brasil não há obrigatoriedade na ordem dos nomes. Trata-se, pois, de mera questão cultural o sobrenome paterno por último.”

Outras formas de reconhecer um indivíduo

A advogada diz que a decisão da Justiça de São Paulo está em conformidade com o pensamento de que o nome perdeu a importância outrora depositada no reconhecimento de uma pessoa. “Isto porque, nos dias atuais, há outras formas de reconhecer um indivíduo, a citar como exemplo: número de RG, CPF, biometria, DNA, facial, entre outros. Tal mudança impactou diretamente na relativização do princípio da imutabilidade do nome.”

“Somado a isso, entendo que a decisão também se atentou ao fato do nome ser atributo da personalidade, vinculado diretamente à dignidade da pessoa humana. Sendo o nome pessoal, as dores e anseios também o são. Portanto, comprovada a ausência de prejuízo a terceiros e diante da justificativa plausível, não há maiores obstáculos para sua retificação.”

Retificações de registro civil proporcionam paz interior

Para Laís, há, na decisão, uma expressão de valores do Direito das Famílias contemporâneo. “A evolução da sociedade nos levou à concepção atual de eudemonista, de busca da felicidade, ao passo que a jurisprudência tem cada vez mais caminhado no sentido de proporcionar a felicidade às partes no âmbito do Direito das Famílias, de maneira a proporcionar um olhar mais cuidadoso em cada caso.”

“Sendo assim, a felicidade por ser subjetiva e o nome de quórum íntimo, as retificações de registro civil demonstram justamente a preocupação em proporcionar paz interior a quem pleiteia. E, é justamente isso que a decisão nos diz, não é plausível negar o acolhimento de desejos íntimos. Ora, se não há prejuízo para terceiros, por que negar a felicidade ao requerente?”, conclui a advogada.

Fonte: IBDFAM

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